A técnica do contracondicionamento na intervenção comportamental
Por Marcus Ronsoni
Os comportamentos são interdependentes: temos a tendência para comer mais quando saímos para fazer refeições fora de casa, para fumar quando aborrecidos mais do que quando ativos, ou para sentirmos mais ansiedade quando sozinhos do que na companhia de amigos.
Para quase todas as atividades saudáveis é possível descobrir estratégias eficazes de contracondicionamento. Um viciado em drogas pode decidir conviver mais com sua família para contrariar o desejo de se drogar, ou um fumante pode iniciar atividades físicas. O contracondicionamento é um dos processos mais potentes disponíveis para os que querem mudar.
Um hábito é mais facilmente substituído do que eliminado. Quando se elimina um comportamento indesejável sem providenciar substitutos saudáveis, o risco de recaídas é muito alto. O contracondicionamento é, em outras palavras, encontrar alternativas para substituir a rotina ou a recompensa do mau hábito, na forma proposta por Duhigg, no livro O Poder do Hábito.
Abaixo abordarei as cinco técnicas de contracondicionamento mais eficazes para comportamentos inadequados motivados por um intenso desejo, apego ou compulsão:
Desvio ativo: A técnica consiste em encontrar uma atividade que substitua o comportamento problemático e o impeça. As possibilidades de desvio ativo são inúmeras: cozinhar, ler, fazer aulas de piano, estudar idiomas, namorar, escrever um livro, entre outras tantas possibilidades. O importante é a pessoa encontrar algo que seja prazeroso e motivador. Quanto mais inspirador, maiores as chances de funcionar como contracondicionamento.
Atividades físicas: Para muitos comportamentos problemáticos o melhor substituto é o exercício físico. Também pode ser utilizado em casos de ansiedade, mau humor, estresse, insônia, desmotivação, nesses casos não como contracondicionamento, mas como apoio ao processo de mudança.
Os exercícios físicos trazem diversos benefícios que auxiliam na mudança comportamental:
- Melhoram a autoestima geral e o prazer pela vida;
- Diminuem a pressão alta;
- Aumentam a resistência muscular;
- Tendões e ligamentos ficam mais flexíveis, facilitando os movimentos, eliminando dores e tensões musculares e aumentando a vitalidade;
- Exercício traz bem-estar mental e ajuda a tratar a depressão;
- Aliviam o estresse e a ansiedade;
- Combatem a insônia;
- Atividades físicas ajudam a produzir serotonina – o hormônio do bem-estar.
Meditação: Existem casos em que a atividade física não é possível ou não é desejada. A meditação é uma técnica que pode se adequar como alternativa.
Alguns efeitos da meditação:
- Reduz o estresse, com maior resiliência após situação estressante;
- Um período mais intenso de meditação melhora a atenção seletiva e reduz a intermitência da atenção;
- A meditação tende a levar a pessoa a uma atitude mais positiva e empática;
- A meditação tende a promover a intuição social;
Além disso, o efeito imediato da meditação é o relaxamento e, com isso, a diminuição da ansiedade, do forte desejo, do apego e da compulsão, facilitando o autocontrole.
Pensamentos contracondicionados: Muitas vezes, um padrão de comportamento é fruto de um padrão de pensamento. Nestes casos, uma das formas de libertar-se de comportamentos indesejáveis é ficar atento aos pensamentos que os estimulam. Os padrões de pensamento englobam também os valores, os juízos e as convicções. Esses pensamentos condicionadores podem se manifestar de diversas maneiras: dando um viés pessimista ou otimista a uma situação; amplificando ou subestimando um problema ou seus riscos; antevendo o que o outro irá pensar; rotulando pessoas e situações; prevendo o futuro; entre tantas outras possibilidades criativas que nossa mente utiliza como lente para perceber o mundo.
Como um caminho para a técnica e a aplicabilidade destes conceitos, podemos nos orientar pelos pressupostos fundamentais da terapia cognitiva, que se aplicam perfeitamente aos pensamentos contracondicionados, pois partem do princípio de que a maneira como pensamos determina o modo como sentimos, nos comportamos e as nossas reações corporais. Assim, os pressupostos fundamentais da terapia cognitiva nos orientam:
- À tomada de consciência das próprias cognições (estar atento aos seus próprios pensamentos);
- À verificação de quão razoáveis, apropriadas ou realísticas tais cognições são (questionar se seus pensamentos são os mais apropriados);
- À correção de cognições irracionais ou inapropriadas (aprimorar o pensamento);
- À transferência das cognições corrigidas na forma de comportamento (transformar os pensamentos aprimorados em comportamentos aprimorados).
Mudar o modo de pensar nem sempre é algo tão simples, por isso, o apoio profissional pode fazer toda a diferença. Durante as interações com o cliente o profissional deve estar atento a manifestações que revelem pensamentos, valores, juízos e convicções que reforçam os comportamentos indesejáveis ou que o afastam dos novos comportamentos. Além disso, deve utilizar técnicas e ferramentas para produzir e manter pensamentos contracondicionadores.
Assertividade: Algumas pessoas oscilam entre sentimentos de inferioridade ou de superioridade de acordo com a pessoa com quem estão se relacionando. Isso lhes concede ou restringe seus “direitos”, impedindo comportamentos mais assertivos. Comportamentos assertivos, nesse caso, são aqueles que a pessoa teria se não estivesse sob a influência de tais interferências emocionais. Ser assertivo, então, é conseguir traduzir em comportamentos as suas mais verdadeiras intenções, tendo o empoderamento pessoal necessário para exercer, sem excesso, os seus direitos:
- O direito de ser ouvido, sem a necessidade de monopolizar as conversas;
- O direito de influenciar outras pessoas, sem a necessidade de convencer a qualquer custo;
- O direito de cometer erros, sem deixar de buscar o melhor;
- O direito de chamar a atenção para si próprio, sem querer ser o centro das atenções;
- O direito de mudar de opinião, mas não simplesmente para seguir uma opinião que lhe parece mais favorável no momento;
- O direito de julgar os seus próprios pensamentos e sentimentos, mas aceitando-se como uma pessoa boa, merecedora, capaz e competente;
- O direito de resistir aos julgamentos de terceiros, mas com a devida flexibilidade, abertura ao novo e aos feedbacks;
- O direito de não ter de se justificar, mas buscando alternativas para a melhoria, crescimento e aprimoramento;
- O direito de ter limites – de conhecimento, de cuidar, nas responsabilidades por terceiros e de tempo, mas que isso não seja desculpa para a acomodação;
- O direito de ter os seus limites respeitados, mas sempre tendo o cuidado para não usar isso como um escudo para a sua inércia.
As interferências emocionais que causam os sentimentos de inferioridade ou de superioridade devem ser abordadas pelo profissional durante o processo de intervenção comportamental. Uma vez identificados quais são os comportamentos indesejáveis que fazem parte do escopo de trabalho de intervenção, o profissional deve abordar o assunto com o cliente, buscando identificar a existência de pessoas que possam provocar essas oscilações, mapeando seus impactos nos comportamentos desejáveis e, assim, elaborando estratégias de enfrentamento. Se o cliente estiver previamente preparado para a situação ele terá melhores condições de ser assertivo.